Grupo Educativo para o Cliente Diabético – Experiência vivenciada no Programa Educação em Saúde com o Cliente Diabético: Uma R

AÇÃO EDUCATIVA NO GRUPO DE DIABÉTICOS EM UM HOSPITAL UNIVERSITÁRIO: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA

 

EDUCATION ACTION GROUP ON THE DIABETIC HOSPITAL UNIVERSITÁRIO ANTONIO PEDRO -UFF: AN EXPERIENCE REPORT

Jesus PBR*, Sabóia VM**, Cavalcanti GSV***, Barbosa SG****

 

RESUMO: Trata-se de relato de experiência vivenciada no Grupo de Educação em Saúde com Diabéticos no Hospital Universitário, quando utilizou-se a  dinâmica participativa, “Linha do Tempo”. Objetivou-se analisar o impacto do Grupo na vida dos clientes, das enfermeiras e estudantes envolvidos; contribuir para maior integração dos participantes e reforçar a importância da Educação em Saúde no tratamento de Diabetes Mellitus do tipo 2. Conclui-se que descrevendo as percepções dos participantes durante o encontro do Grupo dos Diabéticos reforça-se a necessidade da continuidade e implantação de grupos educativos em instituições de saúde.

PALAVRAS CHAVE: Diabetes mellitus. Educação em saúde. Grupos educativos. Enfermagem.

 

ABSTRACT: It is about an experience lived during the Health Education Group at the Hospital Universitário, when we used a dynamic participation,"Time Line". The objectives are: analyze the impact of the group on the lives of clients, nurses and students involved; contribute to a greater integration of the participants and reinforces the importance of Health Education in the treatment of diabetes mellitus type 2. So, we have as conclusion that describing the perceptions of the participants during the meeting of the Group of Diabetics reinforces the need for continuity and implementation of educational groups in health institutions.

KEYWORDS: Diabetes mellitus. Health education. Educational groups. Nursing.

 

INTRODUÇÃO

As doenças crônico-degenerativas têm se tornado um grande problema de saúde pública no Brasil. Descobrir-se portador de uma doença crônica afeta em muitos aspectos a qualidade de vida de um indivíduo, e dentre estas se destaca o Diabetes Mellitus (DM)¹.

O DM é um grupo de doenças metabólicas caracterizadas por níveis elevados de glicose no sangue, denominada hiperglicemia, decorrentes dos defeitos na secreção e/ou na ação da insulina2.

O diabetes do tipo 1, no qual as células beta pancreáticas produtoras de insulina sofrem destruição auto-imune, é elucidado pela presença de infiltração linfocitária nas células pancreáticas e detecção de anticorpos contra estruturas das ilhotas. Há também, o diabetes do tipo 2, o qual resulta da resistência insulínica e funcionamento debilitado das células beta pancreáticas levando a uma produção diminuída de insulina. O tratamento requer o uso de insulina e/ou hipoglicemiantes orais, seguimento de um plano alimentar saudável, atividade física regular, monitoração da glicemia e a participação em grupos educativos sobre diabetes².

Para o enfermeiro, educação é parte intrínseca de sua formação, estratégia fundamental no tratamento com o cliente e importante arma na busca a uma melhor qualidade de vida. No cuidado do cliente diabético, a educação em saúde torna-se um dos pilares da terapêutica a ser instituída.

Devemos conceber a educação “como o processo de formação da competência humana histórica (...), refazendo permanentemente nossa relação com a sociedade e a natureza, usando como instrumentação crucial o conhecimento inovador” ³.

As práticas educativas em saúde não se resumem apenas em transmitir novos conhecimentos para as pessoas, mas sim congregar saberes que possam trazer algum tipo de mudança significativa na vida dos sujeitos envolvidos. Para tanto, são oportunas as práticas grupais educativas, que se baseiam no pressuposto de que os resultados do tratamento dependem da influência benéfica de uma pessoa sobre outra. 4

O desejo de se formar um grupo educativo com a clientela diabética no Hospital Universitário Antônio Pedro (HUAP) surgiu na década de 80, quando uma equipe constituída por dois médicos endocrinologistas, duas enfermeiras, duas nutricionistas e uma assistente social, se uniram com o intuito de trabalhar com essa clientela de um modo mais participativo5.

Atualmente, o Grupo Educativo do Cliente Diabético faz parte do Programa de Extensão Universitária intitulado “Educação em Saúde com Diabéticos: uma realidade no HUAP”. Funciona na sala 42 do ambulatório do HUAP, de segunda a sexta-feira, das 8 às 17 horas, contando com a participação de uma equipe multiprofissional composta por enfermeiras docentes, assistenciais, enfermeiros residentes além da colaboração de médicos endocrinologistas, médicos residentes, nutricionistas e assistente social, que atendem a clientela individual e coletivamente em consultas e encontros grupais com pessoas que vivem com Diabetes Mellitus e seus familiares. Os encontros grupais são coordenados pelas enfermeiras com a participação de residentes, estudantes de graduação bolsistas ou voluntários.

Os encontros ocorrem quinzenalmente, às sextas-feiras, às 8 horas, no segundo andar da Faculdade de Medicina, prédio anexo ao HUAP, sala 5. Nestas ocasiões são abordados temas referentes ao DM, inclusive com a eventual participação de outros profissionais convidados, além de passeios e outras atividades recreativas. Ao inicio de cada ano, é realizado um primeiro encontro, no qual os clientes dão sugestões sobre assuntos a serem abordados nas reuniões, além do agendamento dos próximos encontros e eventos festivos e/ou recreativos.

A educação em saúde deve favorecer aos cidadãos conhecimentos que permitam não só cuidar de sua saúde/doença, compreendendo suas causas e soluções, mas também fomentar a avaliação crítica sobre a qualidade das ações desenvolvidas6.

Acredita-se, assim, que a configuração da existência humana e de sua atividade social própria caracteriza a concepção de sujeito histórico-social e culturalmente determinado. Nesse contexto, a educação é parte tanto do ambiente, quanto da consciência desse sujeito e deve se concretizar como prática transformadora 8,9.

Neste sentido, o estudo em tela tem como objetivo descrever e analisar um encontro grupal, realizado no primeiro semestre do ano de 2008 no qual, como habitualmente foi proposta uma dinâmica participativa denominada “Linha do Tempo”. Nesta atividade, os clientes foram convidados a escrever em uma folha de papel pardo, com canetas hidrocores, como percebiam sua relação com a doença, sua relação com o outro e consigo mesmos, antes e depois de freqüentarem o Grupo dos Diabéticos do HUAP-UFF.

Ao retratar as experiências vividas no Grupo de Diabéticos do HUAP, este artigo visa contribuir no planejamento de ações educativas em saúde, no aprimoramento das atividades realizadas durante os encontros, no sentido de fortalecer a prática educativa em saúde desenvolvida por enfermeiros com grupos específicos da população.

 

MÉTODO

O projeto de pesquisa, de acordo com a Resolução 196/96, foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Antônio Pedro, sob o número de processo 23069.031633/07-55. Para garantir o anonimato dos clientes, os seus nomes não foram citados.

Trata-se de um estudo descritivo, com abordagem qualitativa, realizado a partir do primeiro encontro do Grupo dos Diabéticos de 2008, realizada em 13/06/08, das 08 às 10:30 horas. Para campo de pesquisa utilizou-se a sala 5 da Faculdade de Medicina, prédio anexo ao HUAP, onde esses encontros comumente acontecem a cada quinze dias. Os sujeitos foram 12 pessoas que vivem com diabetes do tipo 2, de ambos os sexos, com idade variando de 40 a 75 anos, alfabetizados e em sua maioria aposentados.

Inicialmente foram levantadas algumas questões tais como: o que os clientes mais gostam e o que não gostam no Grupo, como conheceram o grupo e há quanto tempo, o horário das reuniões, o que mudou em suas vidas após a entrada no grupo e o resultado das consultas de enfermagem com foco na Educação em Saúde. Uma enfermeira residente e uma acadêmica de enfermagem do 7º período foram às coordenadoras da dinâmica e contaram com a colaboração das enfermeiras e serviram como mediadores da dinâmica.

Os clientes foram orientados a escrever como percebiam sua relação com a patologia, com o outro e consigo mesmos, antes e depois de freqüentarem o programa de extensão, além de sugerirem o que gostariam que fosse mudado e caso não quisessem escrever, poderiam desenhar ou ditar para que as mediadoras escrevessem no papel. O tempo médio para redigir os relatos foi de 30 minutos a fim de sistematizar a dinâmica.

O material foi colhido a partir dos relatos escritos pelos clientes nas folhas de papel pardo e pelo livre registro feito pelas mediadoras.

 

ANÁLISE E DISCUSSÃO DO MATERIAL

Alguns relatos demonstraram sentimentos de satisfação e gratidão, despertados pelo conhecimento elaborado a partir dos encontros, pelos laços de amizade e pelas atividades realizadas no Grupo.

Manifestaram ainda, reações emocionais de alegria e orgulho por fazerem parte do Grupo dos diabéticos e, o impacto deste em suas vidas. Os clientes demonstraram satisfação por fazerem parte do programa. Os depoimentos abaixo confirmam tal afirmativa:

“Preciso demais das reuniões: traz paz, alegria e ajuda. Preciso demais de vocês, porque vocês ensinam.” (Participante 1).

“Aqui é um paraíso” (Participante 2).

“Não tenho muito a dizer, mas sim muito a aprender” (Participante 3).

“Aprendi várias coisas... sintomas e tudo mais, e agora posso compreender melhor a doença” (Participante 4).

Os encontros semanais tornaram-se um espaço de troca onde são apresentadas as dificuldades pessoais e coletivas que atrapalham os clientes de viverem uma vida saudável. Nesse espaço de troca, são realizadas perguntas, debates, apresentação de sugestões, relatos de experiências, rompendo o silêncio numa tentativa de valorizá-los, incentivando a sua socialização5.

Além de ser um espaço de troca de experiência, torna-se um ambiente de socialização onde pessoas que têm a mesma doença podem compartilhar as suas dúvidas e anseios e naquele momento, a prática de educação em saúde estará indo além da apresentação de conceitos, modalidades de tratamento, mas sim contribuindo para a integração social.

Questionou-se também quanto ao horário, uma vez que alguns clientes reclamaram quanto as reuniões iniciaram ás 8 horas da manhã, alegando ser muito cedo para saírem de suas casas. Porém a grande maioria presente concordou em manter as reuniões neste horário supracitado.

Os clientes relataram há quanto tempo participam do trabalho grupal:

“Quando descobri a doença, não sabia nada... a forma que recebi a doença foi indiferente por não saber de nada. Desde que entrei no grupo, aprendi muito juntamente com o meu marido” (Participante 1).

“Freqüento o grupo há mais ou menos 7 anos, quando comecei a fazer tratamento de maneira correta” (Participante 4).

“Quando vim para este grupo, eu cheguei morto mas com a bondade da equipe e carinho dispensado, fez com que eu e todos outros tivéssemos uma vida mais alegre e com esperança para o futuro” (Participante 8).

Ao contextualizar esses relatos, pode-se dizer que a educação em saúde torna-se fundamental no tratamento do cliente diabético, à medida em que são oferecidos os instrumentos para que consiga conviver com mais esta dificuldade. Ao aproximar-se do desconhecido, este vai tornando-se menos ameaçador como refere alguns dos clientes. Normalmente o cliente conhece pouco sobre o diabetes mellitus ficando um pouco assustado, porém ao decorrer do tratamento, a doença já parece menos complicada e a adesão se torna mais efetiva5.

A afetividade, confiança, segurança e a capacidade de resolutividade são fatores indispensáveis para a prática de enfermagem no atendimento aos diabéticos5 e isso se reflete em alguns dos relatos a seguir:

“Eu sou apaixonada por esse grupo. Todos nós precisamos muito dele” (Participante 1).

“Como foi bom conhecer este trabalho, foi muito importante porque estou aprendendo a conviver com a diabetes, recebendo muito carinho e amor de toda a equipe” (Participante 6).

“Obrigado pelo trabalho que vocês vêm realizando, continuem a salvar vidas” (Participante 7).

Assim, os profissionais e o cliente deste serviço de saúde estão sob uma aliança de saberes à medida que o relacionamento interpessoal e a interação entre ambos proporcionam uma comunicação eficaz, fortalecendo a formação de vínculos. Portanto, através desse vínculo as ações posteriores se tornam mais facilmente aceitas e efetivas.

O impacto causado pelo Grupo em suas vidas também foi destacado:

 

“O Grupo é muito bom, porque venho aprendendo muita coisa como o que faz bem, o que faz mal; aprendi a alimentação correta. Quando venho aqui me sinto tão bem, pois moro sozinha e aqui faço amigas, converso com as enfermeiras” (Participante 4).

“O Grupo esclareceu muitas dúvidas em minha vida, mas tenho andado um pouco desanimado porque cada dia aparece uma situação diferente” (Participante 5).

“O Diabetes não é um bicho feroz que imaginamos se levarmos na mesma com carinho, teremos uma companheira eternamente até os dias finais de nossas vidas” (Participante 8).

“Antes de conhecer o Grupo eu era uma rosa murcha, me sentia fraco, desanimado, nervoso e sem saber o que acontecia comigo. Costumava ficar com visão turva, tremia muito e suava bastante mas agora sou uma rosa cheia de flores, pois sei como agir diante dos sintomas de hipoglicemia e hoje me sinto bem” (Participante 9).

 

Esses últimos relatos mostram a importância da realização de trabalhos desta natureza, com portadores de diabetes, ressaltando a importância da continuidade dos encontros quinzenais, do acolhimento das enfermeiras, além das mudanças que promoveram na vida de cada individuo diante do Diabetes Mellitus.

A busca para alcançar a mudança de comportamento para o autocuidado desenvolve-se no programa de educação em grupo, mediante a educação, a promoção em saúde e o acesso às informações dos profissionais de saúde. Dessa forma, as atividades adotadas em grupo proporcionam um forte incentivo para a educação em diabetes, uma vez que foram interativas, valorizando o relato das experiências dos próprios participantes10.

Acreditamos no poder da prática educativa em saúde na qual o enfermeiro atua como um profissional responsável por realizar atividades como esta a fim de conscientizar os clientes, informando e sensibilizando a população com intuito de adotar medidas de promoção, prevenção e autocontrole da saúde9.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Foi unânime o relato de que após freqüentarem as consultas de enfermagem e os encontros do grupo e, conseqüentemente aprofundarem seu conhecimento sobre o Diabetes Mellitus e como lidar melhor com a doença, os participantes referiam-se aos enfermeiros como elementos importantes neste processo. A possibilidade de o indivíduo partilhar com outras pessoas problemas semelhantes  leva-o a perceber que não é o único que sofre ou tem dificuldades4  e isso o faz crescer individualmente.

A realização deste estudo evidencia que a participação no “Grupo dos Diabéticos” contribui para aprimorar não apenas o conhecimento dos pacientes a respeito de sua patologia, mas também para criação de vínculos com pessoas que compartilham à mesma problemática e com profissionais de saúde envolvidos no processo.

Ao retratar as experiências e os sentimentos vivenciados no encontro do Grupo dos Diabéticos, no primeiro semestre de 2008, reforça-se a necessidade de permanência e da existência de grupos educativos com a clientela diabética, oferecendo mais subsídios para o planejamento de ações que objetivem o aprimoramento destas atividades.

Esperamos que esta experiência possa contribuir para a construção de novos caminhos na pratica da educação em saúde, pois acreditamos que existe um outro modo de ensinar, fazer e conceber educação em saúde que resgata o sujeito enquanto indivíduo dotado de razão e discernimento e, portanto, considera-o capaz de participar da formação e transformação de relações e instituições, não ignorando as questões estruturais.

O estudo reflete a necessidade de elaborações futuras em pesquisa que venham a demonstrar a importância das atividades em grupo no que tange a visão do enfermeiro sobre a sua própria atuação como sujeito educador.

 

REFERÊNCIAS

1. Costa H. Programa de Controle a Diabetes. Saúde Pública II e III. Centro de Estudos Aprimore. Texto Didático, 2007.

2. Smeltzer SC, Bare BG. Tratado de Enfermagem médico-cirúrgica. 10 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006.

3. Demo P. Educar pela Pesquisa. 4 ed. Campinas, SP: Autores Associados. 2000. 129p.

4. Munari DB, Rodrigues ARF. Enfermagem e Grupos. Goiânia: AB Editora, 1997. 114 p.

5. Sabóia VM. A Mão Dupla do Poder: A enfermeira e os idosos no grupo dos diabéticos do HUAP- UFF. Niterói, RJ: EDUFF, 1997. 115 p.

6. Sabóia VM. Educação em Saúde: A arte de talhar pedras. Niterói, RJ. Intertexto, 2003. 134 p.

7. Severino AJ. Metodologia do Trabalho Científico. 14 ed. SP: Cortez Editora, 1986.  237 p.

8. Bordenave JD, Pereira AM. Estratégias de ensino-aprendizagem. 22.ed. Petrópolis: Vozes, 2001.

9. Gadotti M. Perspectivas atuais da Educação. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.

10. Torres HC, Franco LJ, Stradioto MA, Hortale VA, Schall VT. Avaliação estratégica de educação em grupo e individual no programa educativo em diabetes. Rev. Saúde Pública 43(2): 291-298.



* Patrícia Britto Ribeiro Jesus - Residência em Clínica Médica e Cirúrgica Geral, UNIRIO. e-mail: patty_brj@hotmail.com

** Vera Maria Sabóia - Departamento de Administração e Fundamentos de Enfermagem, UNIRIO. e-mail: verasaboia@uol.com.br

*** Geilsa Soraia Valente Cavalcanti - Departamento de Administração e Fundamentos de Enfermagem, UNIRIO. e-mail: geilsavalente@yahoo.com.br

**** Suellen Gomes Barbosa - e-mail: suellengomesbarbosa@ig.com.br

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