CLAREAMENTO EXTERNO DE DENTE NÃO VITAL

EXTERNAL BLEACHING OF A NON-VITAL TOOTH

Mendes BMS*, Albino LGB **, Rodrigues JA***

RESUMO: O presente estudo apresenta um caso clínico que teve como principal objetivo melhorar a estética do sorriso de um paciente que apresentava dentes escurecidos, especialmente um incisivo central desvitalizado. Como havia risco de reabsorção cervical externa após o clareamento dental interno, optou-se pela limpeza do conduto, cimentação de um pino de fibra de vidro, restauração com resina composta e associação de tratamento clareador externo pelas técnicas de consultório e caseira. Observou-se que o tratamento empregado melhorou a estética do sorriso do paciente, o qual ao final do tratamento estava satisfeito com o resultado obtido.

PALAVRAS CHAVES: Agentes clareadores. Clareamento dental. Pino de fibra de vidro.

ABSTRACT: This study presents a clinical case report which the main objective was to improve the smile’s aesthetics of a patient with discolored teeth, specially a non-vital tooth discolored tooth. Since the patient showed risk factors to external root resorption, it was decided to clean the pulp chamber, restore the tooth with a cemented fiber post and composite resin followed by external dental bleaching with an in office treatment of the devitalized tooth associated with at home bleaching of other teeth. It was observed that the purposed technique improved the aesthetics of the patient smile who was satisfied at the end of the treatment.

KEY WORDS: Bleaching agents; Dental bleaching; Fiber post.

INTRODUÇÃO

A odontologia estética se desenvolveu e inovou consideravelmente nos últimos anos na busca de técnicas para melhorar a aparência dos dentes. Com isso, houve um grande avanço tecnológico na área de materiais restauradores estéticos e adesivos e de técnicas menos invasivas que requerem menor desgaste dental, e o surgimento e a consagração de técnicas extremamente conservadoras como o clareamento dental1.

Para o sucesso do tratamento clareador, é importante ter conhecimento da origem do escurecimento dentário, ou seja, diagnosticar o fator etiológico da alteração cromática e conhecer os diferentes tipos de agentes clareadores, as técnicas e seus efeitos sobre a estrutura dental2.

Dentes com escurecimento devido ao consumo de alimentos e bebidas com corantes, ou seja, devido a fatores extrínsecos são mais fáceis de serem tratados com o clareamento dental do que dentes com escurecimento por fatores intrínsecos devido ao uso de medicamentos como tetraciclinas ou decorrentes de traumas3.

Os agentes clareadores são compostos de peróxido de hidrogênio ou de outros compostos, como peróxido de carbamida e o perborato de sódio, que se decompõem formando o peróxido de hidrogênio. As moléculas de peróxido de hidrogênio se degradam em radicais livres como o oxigênio (O-2), hidrogênio (H+) e o peridroxil (HO2-) que, graças a seu baixo peso molecular, penetram através do esmalte e da dentina, oxidam as moléculas de pigmento e produzem o efeito clareador 3,4. O procedimento em dentes vitais consiste na aplicação do gel clareador sobre os dentes escurecidos. Esse procedimento pode ser realizado no consultório com géis de maior concentração de peróxido de hidrogênio, ou pelo próprio paciente pela chamada técnica caseira ou doméstica utilizando géis com baixa concentração de peróxido de carbamida ou de hidrogênio, ou ainda em combinação dessas técnicas, para obter resultados mais efetivos ou em menor tempo3. O sucesso do clareamento dependerá diretamente da concentração do agente clareador, da sua capacidade de penetração para alcançar as moléculas pigmentadas, da duração (tempo de aplicação) e do número de vezes (frequência) em que ele permanece em contato com os dentes atuando sobre as moléculas4.

O clareamento caseiro supervisionado é geralmente executado com um gel de peróxido de carbamida com concentração entre 10% a 22%, que é aplicado sobre os dentes por meio de um dispositivo confeccionado pelo cirurgião-dentista, uma moldeira individual de acetato no período noturno de 6 a 8 horas, ou diurno, por uma ou duas horas, e apresenta resultados efetivos de duas a três semanas 5,6.

Para o clareamento feito no consultório, utiliza-se usualmente o peróxido de hidrogênio de 30% a 50%, normalmente de três a quatro aplicações de 10 a 15 minutos cada, dependendo da utilização ou não de fonte de luz3. Se necessárias, outras sessões podem ser efetuadas, desde que seja respeitado o período mínimo de 5 a 7 dias entre elas.

Já para dentes desvitalizados, pode também ser indicado o clareamento dental interno, no qual é realizada a abertura da câmara pulpar, são removidos restos de tecidos necróticos e material obturador como guta percha e cimentos endodônticos, é realizado um selamento com um material adesivo do canal para evitar que o agente clareador se difunda para o periodonto e cause uma reação inflamatória que acarrete no desenvolvimento de uma reabsorção cervical externa (RCE). Em seguida é aplicado o agente clareador, que pode ser o peróxido de hidrogênio, o perborato de sódio ou uma mistura de ambos, que é selado na câmara pulpar7. Assim ele permanece selado de cinco a sete dias, quando é realizada a avaliação do clareamento e novas trocas do agente clareador.

Todavia, quando se compara a segurança da técnica do clareamento interno com o externo, observa-se que o risco de efeitos colaterais como o desenvolvimento de uma RCE é muito maior na técnica interna. Porém, são poucos os casos em que se obtém sucesso no clareamento de dentes desvitalizados com a técnica externa.

 

OBJETIVO

O objetivo desse trabalho foi descrever um caso clínico em que o clareamento dental externo foi aplicado com sucesso em um dente desvitalizado.

RELATO DE CASO

Paciente BMM, 20 anos de idade, sofreu um trauma aos 15 anos de idade no dente 21 jogando futebol; como o paciente percebeu que o dente estava escurecendo, procurou um dentista e foi realizado tratamento endodôntico do dente 21. Após 4 anos, o paciente compareceu à clínica de Odontologia da Universidade Guarulhos - UnG com a principal queixa: escurecimento do dente 21. Após exame clínico, observou-se o escurecimento dental (Figura 1) e após exame radiográfico observou-se que o tratamento endodôntico estava satisfatório (Figura 2).

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Figura 1- Aspecto inicial do sorriso do paciente. Note o escurecimento no elemento 21 com tom acinzentado.

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Figura 2- Radiografia periapical na qual se observa o tratamento endodôntico satisfatório no dente 21.

 

As opcões de tratamento para a queixa principal, escurecimento do elemento 21, consideradas foram a confecção de uma coroa total cerâmica, a confecção de uma faceta indireta de cerâmica, uma faceta direta de resina composta ou o clareamento dental.

A opção de tratamento escolhida foi o clareamento dental, em função de ser um tratamento estético que oferece maior preservação da estrutura dental e baixo custo1, especialmente quando comparado aos demais procedimentos restauradores, como confecções de coroas ou facetas2.

Dentre as opções de clareamento dental, poderia-se realizar o clareamento interno ou externo, e optou-se pelo externo por ser mais conservador, visto que pela idade e histórico de trauma o paciente enquadra-se no grupo de risco para desenvolvimento da reabsorção cervical externa.

Para iniciar o clareamento externo, utilizou-se a escala de cor Vita para obter a cor inicial dos dentes antes do tratamento. Foi observado que a cor mais próxima era a A2 (Figura 3).

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Figura 3- Comparação de cor com a escala Vita.

 

O paciente foi moldado com alginato (Jeltrat Dustless, Dentsply) para obter-se o modelo dos dentes em forma de ferradura (Figura 4) e confeccionar-se, em uma plastificadora a vácuo, uma moldeira de acetato para realizar o clareamento caseiro (Figura 5).

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Figura 4- Modelo dos dentes em forma de ferradura.

 

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Figura 5- Confeccionou-se placa de acetato para clareamento caseiro.

 

Em função do escurecimento dental estar associado ao trauma e tratamento endodôntico, a estratégia adotada foi iniciar o tratamento pela desobturação do canal, remoção do tecido necrótico e material obturador remanescente, seguido pela restauração com a cimentação do pino de fibra de vidro.

Antes de começar a desobturação do canal foi realizada a escolha do pino de fibra de vidro utilizando uma escala plástica (Figura 6), e a respectiva broca que possui mesmo diâmetro do pino (White Post, FGM DENTSCARE - Figura 7).

 

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Figura 6- Escolha do pino de fibra de vidro.

 

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Figura 7- Broca do mesmo diâmetro do pino para realizar a desobturação.

 

Foi instalado o isolamento absoluto conforme o protocolo clínico (Figura 8) e começou-se o procedimento com o acesso ao conduto radicular pela face palatina (Figura 9), onde foi realizada a remoção do tecido necrótico e material obturador endodôntico.

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                                                                                    Figura 8 – Isolamento  absoluto do campo operatório.

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Figura 9- Cirurgia de acesso para desobturação.

 

Em seguida, foi realizado o preparo do canal com a remoção da guta-percha utilizando a broca de largo do próprio kit, para receber o pino (Figura ). Após a desobturação do canal (Figura ), colocou-se o pino em posição para observar sua adaptação (Figura), e cimentou-se o pino.

 

 

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Figura 10- Preparo do conduto para receber o pino de fibra de vidro.

 

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Figura 11- Preparo do conduto para receber o pino.

 

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Figura 12 - Pino em posição para verificar sua adaptação.

 

Para a cimentação do pino foi selecionado um cimento resinoso dual, que também tem ativação química (Allcem - FGM). O dente foi condicionado com ácido fosfórico 37% (Condac 37, DENTSCARE – Figura 15). Foi realizado o enxágue com jatos de água durante 10s. Após certificar-se que todo o ácido foi retirado, o preparo foi ligeiramente seco com ar deixando o tecido úmido. Foi aplicado o adesivo (Adper Single Bond II, 3M ESPE) com um microaplicador (Figura ) e foi realizada a fotoativação conforme instruções do fabricante por 20s.

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                                                                                   Figura 13 – Condicionamento ácido.

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Figura 14 – Aplicação do sistema adesivo.

 

O pino foi tratado com a aplicação de uma camada de silano (Prosil, FGM DENTSCARE) por 1 minuto, para a evaporação. O adesivo foi seco com leves jatos de ar.

O cimento resinoso foi dispensado na proporção de 1:1 sobre um bloco de espatulação e foram misturadas as duas pastas com espátula plástica durante 10s. Foi aplicada uma fina camada do cimento ao longo do pino e o cimento foi levado ao interior do conduto radicular comum instrumento rotatório - lentulo.

Em seguida, o pino foi cimentado (Figura 1), e realizou-se a limpeza do excesso de cimento e a fotoativação do mesmo por 60 segundos (Figura 8).

 

Figura 15 – Cimentação do pino de fibra de vidro.

 

 

 

Figura 16 – Fotoativação  do cimento resinoso.

 

Cinco minutos após a fotoativação do cimento resinoso, cortou-se o excesso do pino de fibra de vidro e realizou-se a restauração final com uma resina composta (Figura 9).

 

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Figura 17 – Restauração final.

 

Foram realizados os procedimentos de acabamento e polimento (Figura 10) e exame radiográfico para avaliar a cimentação do pino (Figura 11).

 

 

Figura 18 – Aspecto final da cimentação e restauração.

 

 

Figura 19 – Radiografia final com pino cimentado e dente restaurado.

 

O clareamento dental foi realizado com a combinação das técnicas caseira,  utilizando-se peróxido de carbamida 20% no período noturno (Figura ), e de consultório, utilizando-se peróxido de hidrogênio 35% com duas aplicações isoladas somente no dente desvitalizado escurecido (Figura 21- Isolamento com barreira.E uma terceira aplicação em todos os dentes por sessão (Figura 22).

 

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Figura 20 – Aplicação do agente clareador na placa de acetato e colocada em posição.

 

A técnica em consultório foi realizada com o isolamento do campo operatório utilizando uma barreira protetora em 3 sessões. Como a região incisal respondeu rapidamente ao clareamento dental foi necessária a aplicação do gel clareador somente na região cervical do dente escurecido desvitalizado em duas sessões adicionais, totalizando 5 sessões em consultório (Figura 22)

 

Figura 21- Isolamento com barreira.

 

                                                                                                                      Figura 22 – Clareamento dental em consultório.

 

Figura 23- Resultado final.

 

Pela comparação do sorriso inicial (Figura 1) com o sorriso final (Figura 23), pode-se observar o sucesso alcançado pelo tratamento clareador externo.

 

DISCUSSÃO

No presente trabalho, optou-se pelo uso da técnica de clareamento dental externo devido a esta ser um procedimento não invasivo, que preserva a estrutura dental, e é baixo custo comparado aos demais procedimentos restauradores alternativos , como coroas e facetas1. Contudo, em casos de dentes desvitalizados é indicado o clareamento interno8. Todavia, optou-se somente pela realização do clareamento externo para evitar-se o risco de uma reabsorção radicular externa, visto que o selamento pode não ser efetivo e apresentar falhas ou mesmo a presença de trincas na porção radicular podem permitir uma microinfiltração do clareador para o periodonto.

Como ela tem maior incidência em pacientes que tiveram seus dentes desvitalizados de 6 a 16 anos e principalmente quando os dentes apresentam história de trauma9-11, assim como no presente caso que o paciente possuía 15 anos e a possibilidade de prever clinicamente a existência e a localização de micro-exposições de dentina ao longo da junção amelocementária não existe com os meios atuais de análise, considerou-se que o dente do paciente apresentava risco de apresentar uma reabsorção radicular externa13.

A reabsorção radicular externa é um processo patológico de natureza inflamatória progressiva que se desenvolve na junção amelocementária, imediatamente abaixo do epitélio juncional de dentes clareados. Esta é, certamente, a mais grave sequela do clareamento interno13.

O peróxido de hidrogênio tem um baixo pH e em altas concentrações pode ocasionar a desnaturação protéica (fase orgânica) e desmineralização (fase inorgânica) do elemento dental, que levará a um aumento da permeabilidade dentinária na região cervical, fazendo com que os subprodutos da reação química dos peróxidos possam chegar até a superfície externa da raiz, principalmente na junção amelocementária, ocasionando assim uma injúria ao periodonto, que irá responder por meio de uma resposta auto-imune (inflamatória), enviando osteoclastos para eliminarem o corpo estranho e isso levará a uma reação localizada de reabsorção externa14.

A desobturação previa ao clareamento dental foi com o objetivo de remover tecido necrótico e material obturador endodôntico que estava causando maior parte do escurecimento dental, e embora o agente clareador remova pigmentos orgânicos, sua resposta seria mais demorada caso realizado primeiro, ou haveria a possibilidade de recidiva pois o agente clareador poderia não conseguir remover toda a pigmentação.

A restauração definitiva ocorreu antes do clareamento dental com função de evitar uma contaminação bacteriana no canal, assim evitando um retratamento endodôntico e para que não houvesse uma penetração do agente clareador no interior do canal evitando injúrias, como a reabsorção radicular externa. Dessa forma, após a limpeza da câmara pulpar foi realizada a restauração do dente. Como devido ao tratamento endodôntico, esse se torna mais frágil e susceptível à ocorrência de fratura radicular ao nível da crista óssea, foi utilizado um pino de fibra de vidro na restauração.

Embora o pino não colabore para restituir a distribuição de forças na estrutura dental, sua principal função é modificar a linha de fratura. Caso haja uma fratura devido a um trauma ou até mesmo em função da fadiga mastigatória, a fratura irá ocorrer acima da crista óssea, possibilitando a reabilitação do dente de uma forma mais conservadora, evitando a necessidade de cirurgias de aumento de coroa clínica e garantindo ainda maior estética15.

Foi ainda selecionado um pino translúcido para favorecer a passagem de luz e melhorar a fotoativação do cimento resinoso. Todavia, como há uma dissipação da luz através do cimento e do pino, foi utilizado um cimento dual para garantir a adequada polimerização do cimento no terço apical.

Dessa forma, observou-se que a modalidade de tratamento proposta, ou seja o clareamento externo de um dente que apresenta-se desvitalizado é viável para se obter um resultado estético satisfatório de modo conservador.

 

CONCLUSÃO

O caso clínico apresentado demonstrou que o clareamento externo pode ser considerado um tratamento eficaz na reabilitação estética de dentes escurecidos desvitalizados.

 

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* Bruno Miranda dos Santos Mendes - Aluno de Graduação em Odontologia da Universidade Guarulhos – UnG. e-mail: brunomendes.ms@gmail.com

** Luis Gustavo Barrotte Albino - Mestre em Odontologia- Área de Dentística e Professor da Universidade Guarulhos - UnG. e-mail: clinicaluisgustavo@hotmail.com

*** José Augusto Rodrigues - Mestre e Doutor em Clínica Odontológica- Área de Dentística e Professor da Universidade Guarulhos - UnG. e-mail: jrodrigues@prof.ung.br