APLICAÇÕES
DOS LASERS DE ALTA POTÊNCIA EM ODONTOLOGIA
APPLICATIONS
OF HIGH-INTENSITY LASERS IN DENTISTRY
Jorge ACT*;
Cassoni A**; Rodrigues JA***
RESUMO: Esta revisão de literatura tem como
objetivo esclarecer o uso e os tipos de lasers de alta potência que podem ser
utilizados na odontologia e suas indicações. Os lasers são divididos em dois
grandes grupos: os lasers para terapia de baixa potência (Low-Intensity laser Therapy, LILT) – e os lasers cirúrgicos
de alta potência (High-Intensity Laser
Treatment, HILT). O primeiro laser dental cirúrgico possuía como meio ativo
o Nd:YAG e era indicado para manipulação de tecido mole. Na sequência, foram
lançados no mercado outros tipos de Nd:YAP, e também outros tipos de lasers,
como o CO2 e o de Argônio, somente para cirurgia em tecidos moles
intraorais. Em seguida foram desenvolvidos laser para tecido duro dental como o
Er:YAG e o Er,Cr:YSGG. Cada tipo de laser deve ser utilizado de forma que seja
absorvido ao máximo, garantindo sua efetividade ao mesmo tempo em que evite
danos aos tecidos adjacentes.
PALAVRAS-CHAVE: Terapia a laser. Lasers. Odontologia.
Revisão. Esmalte dental. Procedimentos Cirúrgicos Bucais.
.
ABSTRACT: This literature review aims to explain the use and types of high-power
lasers that can be used in dentistry and their indications. Lasers are divided
into two main groups: laser therapy for low power LILT (Low-Intensity Laser
Therapy) - surgical lasers and high power or Hilt (High-Intensity Laser
Treatment). The first dental surgery laser had Nd:YAG as active medium and was
indicated for the manipulation of soft tissue. Then other types of Nd:YAG
became available on the market, as well as other types of lasers, such as CO2
and Argon, which were only used for the surgeries on intraoral soft tissues.
Some lasers, such as Er:YAG and Er,Cr:YSGG, were then developed for dental hard
tissues. Each type of laser must be adequately used to ensure its optimum
absorption and its best effectiveness without damaging the adjacent tissue.
KEY-WORDS: Laser
Therapy. Lasers. Dentistry. Review. Dental enamel. Oral Surgical Procedures.
Energia
Laser
A palavra LASER
vem do acrônimo em inglês Light
Amplification by Stimulated Emission of Radiation, o que significa
"amplificação da luz por emissão estimulada de radiação".
O desenvolvimento
da tecnologia dos lasers foi possível através das pesquisas realizadas na área
da física quântica, na qual foram delineados os princípios que tornaram
possível a idéia de utilizar moléculas e a radiação estimulada. Introduzido por
Einstein em 1905 usando a teoria de Planck (1900), este conceito demonstrou que
a energia de um feixe de luz era concentrada em pequenos conjuntos de energia,
denominados fótons, explicando assim o fenômeno da emissão fotoelétrica. Foi
descrito que quando um fóton colide com um elétron, ele estimula a liberação de
outro fóton amplificando a emissão inicial.
No final da década de 40, começo da década de 50,
Charles Townes, professor da Universidade de Columbia, em Nova Iorque, estava
fazendo estudos espectroscópicos de moléculas utilizando radiação de micro-ondas.
Ele pretendia produzir micro-ondas mais curtas do que aquelas utilizadas nos
radares da Segunda Guerra Mundial. Ele e seus colaboradores foram bem
sucedidos, produzindo radiação estimulada de comprimento de onda de 1cm, o que
foi batizado com o nome MASER referindo-se à radiação estimulada na região de
microondas. O maser foi assim, o precursor do laser1.
Em 1960 Maiman,
utilizando teoria da emissão estimulada, desenvolveu a primeira fonte emissora
de laser. Esta foi obtida pela excitação de uma roda de rubi com pulsos
luminosos intensos e se localizava na faixa visível do espectro luminoso
(λ=694nm), que resultou no primeiro raio laser no espectro vermelho2.
A luz ou radiação
eletromagnética de um laser se caracteriza por ser um fluxo luminoso altamente
colimado (feixes de luz paralelos), de alta intensidade de energia e altamente
concentrada. Os lasers são nomeados de acordo com o meio ativo pelo qual são
estimulados. Atualmente, diferentes meios ativos estão disponíveis sendo
sólidos, líquidos ou gasosos, cada meio resulta em um tipo diferente de
radiação ou comprimento de onda, como pode-se observar na figura 1, a qual
possui diferentes formas de interação com os diferentes meios e resultam em um
tipo diferente de efeito3. Ou seja, os lasers apresentam diferentes
comprimentos de onda que possuem características próprias que podem sofrer
quatro diferentes fenômenos: absorção, penetração, transmissão e difusão. Em
Odontologia o fenômeno mais desejável é a absorção, pois quando ocorre há a
interação com o tecido alvo.
Figura 1 - Espectro eletromagnético (em
nanômetros)
Dessa forma, para
que o laser seja efetivo é necessário que seja absorvido pelos tecidos sendo
que no caso dos lasers para terapia de baixa potência (LILT- Low-Intensity laser Therapy) o laser
deve ser absorvido e estimular um efeito biomodulador. Já os lasers cirúrgicos
de alta potência (HILT- High-Intensity
Laser Treatment) agem através da produção de calor. Embora os tecidos
biológicos sejam pouco homogêneos do ponto de vista óptico, a escolha do tipo
de laser deve ser feita como regra em função de sua interação com o tecido
alvo, seja esse tecido mole ou duro.
Portanto, esta revisão de literatura tem como
objetivo esclarecer o uso e os tipos de lasers de alta potência que podem ser
utilizados na odontologia e suas indicações.
Primeiros
Lasers na Odontologia
Em 1990 foi o ano
que a American Dental Laser (ADL), obteve autorização do Food and Drug Administration
(FDA) para comercializar o primeiro laser dental que possuía como meio ativo
neodímio:ítrio-alumínio-granada (Nd:YAG, λ=1.064 nm). A FDA autorizava seu
uso na manipulação de tecido mole, e o laser apresentava uma potência máxima
média de 3 watts e poderia ser pulsado até 30 vezes por segundo (30Hz). O
equipamento foi vendido por aproximadamente US$ 50.000,00. Em seguida foram
lançados no mercado outros tipos de neodímio, e também outros tipos de lasers
como o CO2 (dopado com gás de dióxido de carbono), laser de Argônio
com dois comprimentos de onda, o azul (l=488 nm) e o
verde (λ=514,5 nm) e os lasers de Diodos semi-condutores (l=620nm a
λ=2.500 nm), todos autorizados pela FDA somente para cirurgia em tecidos
moles intra-orais.
Em 1997, a FDA
concedeu à Premier Laser Systems a
autorização para a comercialização do primeiro laser para tecido duro dental, sendo
esse o érbio dopado por ítrio alumíno e granada (Er:YAG, λ=2.940 nm).
Pouco depois, outros fabricantes ofereceram outros lasers de érbio como o érbio
cromo dopado por ítrio escândio gálio e granada (Er,Cr:YSGG, l=2.780 nm) para
tecidos duros dentais3. Atualmente, um laser cirúrgico custa de US$
10.000,00 a US$ 75.000,00.
No Brasil, a
introdução da tecnologia do laser foi bastante tardia, em comparação com outros
países da Europa e os Estados Unidos. Os trabalhos pioneiros nesta área datam
na metade da década de 1980 e foram realizados por Duarte Brugnera, Aun,
Watanabe e colaboradores. Atualmente diversas universidades brasileiras começam
a introduzir o uso de laser nos conteúdos programáticos das disciplinas. Os lasers são divididos em dois grupos: os
lasers não cirúrgicos, utilizados para terapia de baixa potência (LILT - Low-Intensity laser Therapy), e os
lasers cirúrgicos de alta potência (HILT - High-Intensity Laser Therapy), e
adicionalmente temos ainda lasers utilizados para terapia fotodinâmica e
diagnóstico fluorescência tecidual.
Lasers de alta
potencia indicados em Odontologia
Os principais
lasers de alta potencia indicados para odontologia são o Nd:YAG (l=1.064 nm) e CO2
(l=9.300
nm, 9.600 nm, 10.300 nm e 10.600 nm), para tecidos moles e o CO2, e
o Er:YAG (l=2.940 nm), Er,Cr:YSGG (l=2.780 nm) para
tecidos duros.
Um fator muito
importante que deve ser considerado quando se utiliza um laser é a energia que
deve ser utilizada, pois ela está diretamente relacionada com a efetividade ou
não do tratamento desejado.
Os lasers para
tecido mole são utilizados para incisões e homeostasia, como possuem boa
absorção por pigmentos e sangue e atuam por vaporização. Quando uma superfície
é irradiada têm-se a formação de 3 zonas bem definidas sobre o tecido hígido.
Uma zona de vaporização, uma de necrose, e outra de coagulação. Essas zonas
variam em tamanho de acordo com a energia e foco do laser aplicado. Quanto
maior a energia, maior a zona de vaporização e será realizada uma incisão mais
profunda, com a vantagem de ser livre de sangramento e reduzir o número de
microrganismos. Dessa mesma forma, quanto menor a energia, menor será a
vaporização e maior a zona de coagulação.
Além da energia, o
foco do feixe de laser também influencia na relação vaporização/coagulação,
quanto mais focado menor é o diâmetro e maior a profundidade da incisão. Se o
laser for desfocado diminui a vaporização resultando no aumento do diâmetro da
incisão e redução da profundidade, sendo que quanto mais desfocado maior é o
efeito de coagulação e hemostase.
Os lasers para
tecido duro atuam por ablação, que é um mecanismo no qual energia do laser
absorvida pela água e pela hidroxila na hidroxiapatita, causando um rápido
aquecimento e aumento de volume resultando em altas pressões internas que levam
à remoção do substrato na forma de microexplosões4,5.
Alguns estudos
demonstram que o uso dos lasers de Nd:YAG, de érbio e CO2 com densidade
de energia podem ser utilizados para aumentar a resistência dental aos ácidos.
São três as principais teorias existentes que tentam explicar as alterações
ocorridas durante a irradiação com o laser de Er:YAG, promovendo a redução na
permeabilidade do esmalte devido à fusão e recristalização da superfície de
esmalte6,7. A redução na solubilidade do esmalte devido à formação
de substâncias menos solúveis como o monóxido difosfato de tetracálcio ou
fosfato de tetracalcio8 ou a redução na permeabilidade do esmalte
devido às mudanças na ultraestrutura, decorrente da decomposição protéica.
Como os lasers de
alta potência atuam por meio do aumento na temperatura, seu uso traz ainda como
vantagem a descontaminação da superfície irradiada, dessa forma há uma maior
probabilidade de ocorrer uma reparação tecidual sem a presença de infecção na
ferida cirúrgica.
Em função de cada
equipamento, o laser pode ser utilizado em modo contínuo, pulsado, sendo que o
uso no modo pulsátil apresenta como vantagem a possibilidade de haver o
resfriamento do tecido adjacente ao tecido alvo. A frequência dos pulsos é
sempre medida em Hertz, ou seja pulsos por segundos.
Laser de Nd:YAG (neodímio
dopado com ítrio-alumínio-granada, l=1.064 nm)
O laser de Nd:YAG
foi desenvolvido por Johnson em 1961, pode ser utilizado de modo pulsado. Tem o
principal comprimento de onda de emissão de λ=1.064 nm (Figura 1), potência variável e número de pulsos por segundo
também variável de acordo com o tipo de aparelho. Por não ter um comprimento de
onda visível, emite próximo ao infravermelho, apresenta geralmente como luz
guia o laser de HeNe. A absorção deste tipo de laser é difusa e transmitida aos
tecidos1.
Como
este laser é bem absorvido por pigmentos e sangue, é indicado para uso em
tecidos moles. Quando este raio é utilizado sem contato direto, ocorre difusão
para o ambiente, e a difusão de calor dentro dos tecidos pode chegar a 7mm de
profundidade, gerando uma área maciça de coagulação. Por esta característica,
em medicina o laser de Nd:YAG pode coagular artérias e veias de 2-3mm de
diâmetro. Esta forma de radiação pode ser levada aos tecidos através de fibras
ópticas de contato direto9. Adicionalmente, quando emitido com
pulsos de 10-12 ms, este laser não causa efeitos térmicos, mas sim cria um
estado de ionização que resulta na formação de choques que promovem a fotodisrupção
do tecido. É bastante utilizado na oftalmologia e também para remoção de
tatuagens e manchas pigmentadas10.
Para
tecidos duros o laser de Nd:YAG tem sido estudado na prevenção de
cárie/desmineralização desde a década de 70. O que possibilita o seu uso na
prevenção é a capacidade de ser conduzido por fibra óptica de quartzo,
proporcionando fácil acesso aos sulcos e fissuras da cavidade oral. Entretanto, os lasers para
prevenção de cárie devem interagir com o esmalte dental cujo conteúdo inorgânico
consiste basicamente de fosfato de cálcio cristalino e hidroxiapatita. O
esmalte possui bandas de absorção no infravermelho, em 2.900 nm, 7.900 nm e
9.600 nm. Sabendo-se que o comprimento de onda do laser de Nd:YAG é 1.064 nm, ele é pouco absorvido pela hidroxiapatita e água (Figura 1), e por isso
deve-se utilizar um foto iniciador.
O fotoiniciador deve ser
de um material com pigmento escuro, que pode ser líquido ou sólido, como solução
composta por carvão puro diluído em partes iguais de água deionizada e etanol
99% - e tinta nanquim, e deve ser aplicado sobre a superfície do esmalte
previamente à irradiação com o laser. Este mecanismo tem sido utilizado por
diversos autores e tem demonstrado ser eficaz11,12.
Yamamoto
& Sato (1980)13 foram pioneiros neste assunto e realizaram um
trabalho no qual as amostras previamente irradiadas com laser de Nd:YAG foram
imersas em solução ácida desmineralizante com pH de aproximadamente 4,5 durante
o período de 5 dias. Os resultados mostraram que em 73% das amostras não houve
nenhuma desmineralização e em 27% houve resistência moderada. Bedini et al. (2010)14 demonstraram
que o uso do laser de Nd: YAG com baixos níveis de potência entre 0,6 e 1,2 W
preservam a integridade da superfície do esmalte e diminuem a desmineralização.
Outros
estudos demonstram que o uso do laser quando comparado ao tratamento com flúor
tem resultados superiores15-18.
Estudos que avaliaram densidades
de energia do laser de Nd:YAG entre 10 a 50 J/cm2 concluíram que
quanto maior a densidade de energia utilizada, melhor o resultado obtido ou
seja maior a resistência adquirida do esmalte. Trabalhos mais recentes
concordam com o citado anteriormente e testaram densidades de energia maiores
como 84,9 J/cm2 , 99,5 J/cm2 e 113 J/cm2, e
tem comprovado a sua eficácia 17-18.
Com
relação à profundidade de atuação do tratamento com o laser de Nd:YAG,
Korytnicki et al (2006)17 demonstraram através do teste de
microdureza Knoop, que o esmalte dental irradiado pelo laser apresentou valores
maiores de microdureza até a profundidade de 60 µm, quando comparado com o
grupo controle (não irradiado) sendo que ambos foram submetidos ao teste de
desafio cariogênico in situ.
Laser de Nd:YAG com frequência Dobrada ou KTP (fosfato-titânio-potássio)
O laser de Nd:YAG pode também emitir um comprimento de
onda de λ= 532 nm no espectro verde (Figura 1), sendo então
chamado de KTP (fosfato-titânio-potássio), o qual possui
efeitos teciduais comparáveis ao laser de íon argônio. Contudo, tecnicamente
este laser é completamente diferente já que utiliza um cristal de fosfato-titânio-potássio.
Sua potência atual gira em torno de 30W. O KTP é um cristal não linear, que não
emite luz laser diretamente. O cristal de KTP pode ser utilizado em uma gama
extensiva de tamanhos e é comparativamente de mais baixo custo do que outros
cristais não lineares18.
Na medicina,
especificamente nas especialidades de Angiologia e Dermatologia, são amplamente
utilizadas em remoções de tatuagens e lesões pigmentadas exógenas ou endógenas,
com ótimos resultados. A luz do laser, sem lesar a pele, irá atingir
diretamente o pigmento, promovendo a quebra e absorção pelo organismo. Acarreta
em um aumento térmico em torno de 25°C, não provocando danos aos tecidos
circunvizinhos19.
Na odontologia,
é indicado para a descontaminação de canais radiculares e para o clareamento
dental. Existem poucos estudos, porém as alterações térmicas e microestruturais
resultantes do preparo radicular com o uso do laser KTP:YAG com potência de 3W,
frequência de 5Hz por dois segundos não causaram danos aos tecidos
circunjacentes19.
Laser de CO2
(dióxido
de carbono)
O laser de CO2
foi desenvolvido por Patel et al em 196422. Na realidade o meio
ativo deste laser é uma mistura de CO2, nitrogênio e hélio. Essa
mistura, faz com que o processo de geração dos fótons seja mais efetivo. As
moléculas de N2 são excitadas por uma corrente elétrica, que excitam
e transferem sua energia através de colisões com as moléculas de CO2
em estado de repouso, o que resulta na liberação de fótons infravermelhos. A
presença do hélio visa facilitar a transferência de calor entre o meio ativo e
as paredes da cavidade óptica20.
Para aplicações em
Odontologia, os aparelhos de laser de CO2 são fabricados para emitir
diferentes comprimentos de onda (l=9.300 nm,
9.600 nm, 10.300 nm e 10.600 nm) operam em não contato e apresentam modos de
produção de energia pulsados. Vale salientar que este é um laser cujo
comprimento de onda possui uma afinidade excelente por líquidos e tem pouca
afinidade por cores21.
Quando este laser
entra em contato com a pele ou mucosa pode produzir várias alterações. Se a
temperatura da pele é elevada a uma temperatura não superior a 45°C por 1ms,
ocorre apenas um dano reversível. Contudo, se a temperatura exceder 60°C, o
dano será irreversível, uma vez que o colágeno tipo I se dissolve se for
exposto a esta temperatura por mais de um segundo. O DNA é afetado acima de
75°C, o tecido vaporiza a 100°C e acima de 300°C a carbonização é frequentemente
observada22.
O laser de dióxido
de carbono tem sido cada vez mais utilizado nas cirurgias bucais como
alternativa eficiente às cirurgias convencionais, pois possui boa absorção pela
água do tecido, resultando na vaporização do liquido intra e extracelular com
desintegração das células. As vantagens estão na eliminação precisa dos tecidos
com hemostasia e redução bacteriana simultânea, e pós-operatório com processo
inflamatório mais ameno pela redução da infecção21.
Em esmalte, o laser
de dióxido de carbono também é absorvido (Figura 1), pois é composto
basicamente por hidroxiapatita e hidroxila presentes na estrutura do cristal que
possuem ressonância com as bandas de absorção na região do infravermelho23.
É mais absorvido pelo CO2 com o comprimento de onda de 9.600 nm, mas
mesmo o laser com comprimento de onda de 10.600 nm é absorvido pelo esmalte24.
O laser de CO2
tende a ser intensamente absorvido próximo a superfície de esmalte, e a
energia é transformada rapidamente em calor25, o que consiste em um
efeito importante para as transformações físico-químicas do substrato dental,
tornando-o mais ácido-resistente. O ponto de fusão e ressolidificação da
hidroxiapatita carbonatada varia de acordo com o conteúdo de carbonato26.
A superfície de esmalte, que contém aproximadamente 2% de carbonato, começa o
processo de fusão a 1100°C e se funde à temperatura de 1280°C ou em
temperaturas mais elevadas27,28.
Feathertone et al.
(1998)26 utilizaram doses que provêem resistência ácida ao esmalte dental
e observaram que a irradiação com CO2 (l=9.600 nm; 1-3
J/cm2) acarretou no aumento de 1°C ou menos, o que indica que há
preservação da vitalidade pulpar pós-radiação. Já o laser com comprimento de
onda de 10.600 nm com 10 J/cm2 promoveu um aumento de temperatura de
aproximadamente 100°C, indicando que o potencial inibidor ocorreria em
detrimento da vitalidade pulpar.
A maior parte dos
estudos iniciais que empregaram os lasers de CO2 com finalidade de
prevenir cárie utilizaram-no em modo contínuo. Nesse modo, grande parte da
energia é absorvida e é conduzida para o interior do dente, o que resulta em
aquecimento e possível dano pulpar. Consequentemente, o uso em modo contínuo é
menos eficaz e mais perigoso que o uso em modo pulsado. Desta forma, os lasers
pulsados propiciam um aumento nas densidades das potencias de pico enquanto
mantêm baixa a densidade de energia por pulso, minimizando assim o efeito
acumulativo de deposição de energia. Isto significa que as alterações na
estrutura dentária podem ficar confinadas a uma fina camada superficial sem
afetar os tecidos adjacentes. Quanto menor a duração do pulso, mais localizada
será a distribuição de calor e, por conseguinte, durações mais longas
distribuirão energia em níveis mais profundos dos tecidos, podendo causar danos
térmicos indesejáveis29.
Laser de Er:YAG
(érbio dopado com ítrio alumínio e granada)
O laser de Er:YAG foi desenvolvido por
Hibst & Keller em 19895, sendo o primeiro laser aprovado pela
FDA para tecidos duros em 199728. Possui efeitos fotoablativos
(fototérmico, termoablativo) e é emitido em um comprimento de onda de
λ=2.940 nm em pulsos da ordem de 0,1 ms a 0,4 ms. Existem peças de mão
diferenciadas para utilização na cavidade bucal3.
Geralmente as peças de mão possuem um
dispositivo (spray) de água e ar. Este sistema deposita uma película mínima de
água sobre a zona de trabalho, e graças à grande absorção do laser de Er:YAG,
quando a energia liberada chega à zona de impacto é absorvida pela água,
favorecendo os fenômenos ablativos e evitando um possível aumento de
temperatura. Evita-se assim o ressecamento dos tecidos mineralizados, como o
esmalte, dentina e o osso promovendo alta precisão de corte com mínima geração
de calor (3°C) e ficando dentro dos limites histopatológicos permitidos para o
tecido pulpar (5,5°C)30.
Na Periodontia,
pode ser utilizado para a descontaminação de bolsas periodontais, e nos
tratamentos cirúrgicos periodontais, apesar de ser mais indicado para
manipulação de tecidos duros pode ser utilizado em tecidos moles.
Os lasers de
Er:YAG tem vasta utilização na odontologia, e pela sua grande capacidade de
corte dos tecidos duros dentais, vem sendo indicado principalmente na
Dentística. Isso ocorre em virtude da emissão do laser Er:YAG ter um
comprimento de onda de 2.940 nm que coincide com um dos picos de absorção da
água e da hidroxiapatita, permitindo trabalho no dente com precisão,
intensidade e profundidade sem danos a polpa nem à dentina. A radiação emitida
é fortemente absorvida pela água e induz a uma rápida elevação de temperatura e
pressão, ocasionando a remoção do tecido aquecido por meio de ablação4,5.
Alguns estudos
apontam que o preparo de cavidades com laser possibilita o máximo de
conservação de estrutura dental, baixa necessidade de anestesia com a característica
adicional de tornar o esmalte, a dentina e o cemento que sofreram irradiação,
mais resistentes ao ataque ácido das bactérias31-35.
No que se refere à
dentina cariada, o laser já foi amplamente apontado como capaz de removê-la sem
causar injuria pulpar, e de tornar a dentina sadia subjacente menos permeável e
com dureza semelhante a do esmalte3.
Além disso,
trabalhos demonstram que muitos pacientes ao serem questionados, relataram
menor desconforto quando tiveram os preparos cavitários realizados com laser,
quando comparados à turbina convencional36.
Porém,
muitos estudos vêm apontando a diminuição da resistência adesiva como uma das
principais contraindicações para a confecção de preparos cavitários realizados
com laser. O que demonstraram Chimello-Sousa et al (2006)37 que
concluíram em sua pesquisa que os grupos que tratados com laser apresentaram
menor resistência adesiva quando comparados aos com tratamento convencional.
Perito
et al (2009)34 chegaram à conclusão que houve
menor desenvolvimento de lesões de cárie em torno de cavidades preparadas com
laser de Er:YAG do que em torno das cavidades preparadas com ponta diamantada,
no entanto, não houve efeito sinérgico cariostático observado entre o laser de
Er:YAG e cimento de ionômero de vidro.
Er,Cr:YSGG (érbio
cromo dopado com ítrio escândio, galio e granada)
O
laser de Er,Cr:YSGG é o laser mais recente introduzido na odontologia,
apresentando comprimento de onda de 2,78µm é absorvido, principalmente, pela
água e hidroxiapatita presentes nos tecidos duros dentais, causando
microexplosões e remoção do tecido alvo por ablação38-42. Uma das
características diferenciadas deste laser é a regulagem de ar/água.
Os primeiros
estudos sobre este laser em odontologia iniciam-se no ano de 1995, quando
Belikov et al43 realizaram um estudo utilizando o laser de
Er,Cr:YSGG, variando a densidade de energia e tempo de exposição, na remoção do
tecido contaminado, e avaliaram a quantidade e tipos de bactérias remanescentes
na estrutura dental.
Em seguida Fried
et al (1996)37 realizaram um trabalho sobre prevenção de lesões de
cárie com o laser de Er,Cr:YSGG e obtiveram inibição entre 25 e 60%,
trabalhando com parâmetros subablativos.
Por meio de
analises químicas realizadas na estrutura dental pós-radiação com o laser de
Er,Cr:YSGG, Yu et al (2000)39, demonstraram um aumento nos íons de
cálcio na superfície do esmalte, acreditam que tenha ocorrido uma reorganização
dos cristais de hidroxiapatita após o efeito térmico do laser.
Freitas et al
(2008)43, supõem que, relativo à prevenção de cárie, o laser de
Er,Cr:YSGG não promova ablação da superfície, mas uma mudança química na
estrutura de esmalte através do aumento superficial de temperatura.
Abad-Gallegos et
al (2009)44 chegaram à conclusão que a irradiação com laser de
Er,Cr:YSGG utilizando 1W ou 2W por 30 segundos, com movimentos circulares
contínuos por 2mm/s, ocasionou um aumento insignificante na temperatura da
superfície radicular, sendo este aumento insuficiente para ocasionar danos aos
tecidos circundantes (ligamento periodontal e osso alveolar) no tratamento dos
dentes
Jorge et al (2010)45
avaliaram in situ a influência do preparo cavitário utilizando o laser de
Er,Cr:YSGG e materiais restauradores contendo flúor na prevenção de lesões de
cárie e observaram que o laser de Er,Cr:YSGG quando utilizado para o preparo
cavitário pode prover ácido-resistência ao esmalte dental adjacente. Matsumoto
et al (2002)46 fizeram um estudo sobre a
aceitação pelo paciente em relação ao laser de Er,Cr:YSGG. A maioria dos casos (94%)
foram preparados, sem anestesia e dor foi sentida em 34 casos (68%). Nenhuma
reação adversa foi observada em nenhum dos casos, e a aceitação do paciente
para este sistema foi favorável. Todos os casos tiveram um bom
prognóstico. Em
45 casos (90%), avaliação clínica geral foi satisfatória. A partir do presente estudo,
pode-se concluir que o laser é um equipamento eficiente, eficaz e seguro para
remoção de tecido cariado e preparos cavitários.
Ambiente seguro
para uso clínico dos lasers
Deve existir uma
pessoa responsável pelo uso do laser que deve ter o poder das chaves, para
limitar o acesso aos aparelhos, e que conheça as características de cada tipo
de laser e seja capaz de treinar os operadores e exigir que os mesmos cumpram
todas as normas de segurança. Este treinamento deve ser registrado e assinado
pelos membros participantes e no final deve ser realizada uma avaliação teórica,
orientando e exigindo que os operadores utilizem os óculos de segurança
específicos para bloquear cada comprimento de onda do laser utilizado. Para
tanto, cada usuário deve ser instruído a verificar na parte superior da lente
dos óculos de proteção a descrição do comprimento de onda que é bloqueado pela
lente (figura 2).
Ainda em relação
aos operadores esses devem utilizar uma mascara de proteção PFF-2/N95 (figura 2), esta mascara é recomendada pelo Centro para Prevenção e Controle
de Doenças – EUA, pois possui 99% de Eficiência de Filtração
Bacteriológica (BFE), e seu registro no Ministério da Saúde: 10002079056
(ANVISA). Essa máscara é recomendada para proteção das vias respiratórias e
redução da exposição contra certos aerodispersóides em uma faixa de tamanho de
partículas de 0,1 a 10 µm (diâmetro aerodinâmico médio) ou maiores, incluindo
as geradas por eletrocautério, cirurgia a laser, e outros instrumentos médicos
elétricos. Sendo que os procedimentos à LASER geram aerossóis com partículas
que têm em média 0,3μm.
Figura 2- Equipamentos de proteção para a
utilização dos lasers de alta potência.
O consultório deve
conter ainda um aparelho de sucção a vácuo para aspirar todos os resíduos (líquidos e sólidos) que são
produzidos durante o procedimento cirúrgico, esses resíduos são descartados
diretamente para o esgoto, diminuindo os riscos de contaminação por aerossóis.
Ainda fazendo parte das normas de segurança
do lado externo do consultório deve conter uma placa de advertência, indicando
que naquele ambiente se trabalha com laser de alta potência (figura 2). Na porta de entrada do mesmo deve haver também um
sistema denominado de Interlock. Este
é composto por um ímã, que quando fechada a porta será energizado e o sistema
de funcionamento do laser será liberado. Simultaneamente uma luz vermelha no
exterior do consultório sinalizará que o laser está sendo utilizado. Em caso de
abertura da porta, para a segurança de quem está entrando e não está devidamente
paramentado, o fornecimento de eletricidade para o laser é cortado
imediatamente.
O profissional ao utilizar o laser de alta
potência, não deve em hipótese alguma associá-lo com sedação por óxido nitroso,
pois este é altamente inflamável, podendo ocasionar acidentes.
Considerações
finais
A escolha do tipo
de laser deve ser feita em função de sua interação com o tecido alvo, seja esse
tecido mole ou duro e é de extrema importância para determinar o melhor laser
para cada tipo de tecido alvo. Existem algumas aplicações ou técnicas que fogem
a regra em função da variabilidade individual de cada ser humano que pode
apresentar o esmalte dental mais mineralizado ou uma gengiva mais fibrosa que
pode necessitar de variações na dose recomendada para se alcançar o efeito
desejado.
Entretanto, para
atuar em tecido mole as opções mais indicadas são os lasers de CO2 e
de neodímio, para a realização de debridamentos periodontais, gengivoplastia,
ou a remoção de lesões da mucosa oral como mucoceles a melhor opção são os lasers
que atuem em tecidos moles.
Já para atuar em
tecidos duros temos os lasers de érbio, indicados para dentística na realização
de preparos cavitários, para selamento de fóssulas e fissuras e prevenção no
padrão subablativo. Podem ser utilizados também em periodontia e endodontia. Já
o laser de Nd:YAG quando utilizado com corante possui absorção pela
hidroxiapatita e pode ser utilizado também para prevenção de cárie dental.
Todavia, o CO2
parece ser a melhor opção para o clinico geral porque ele é indicado para
tecido mole e pode ser usado em tecido duro, sendo cauteloso com o uso do modo
de frequência do pulso pois pode-se ocasionar o aumento da temperatura
intrapulpar.
Como cada tipo de
laser interage de forma diferente com os tecidos moles e duros, deve-se
selecionar o laser para que sejam aproveitadas ao máximo as suas qualidades e
que ao mesmo tempo evite danos aos tecidos adjacentes, sempre utilizando a
menor quantidade de energia necessária para obter o efeito desejado.
AGRADECIMENTO
A FAPESP pela concessão da bolsa de
mestrado processo 2008/08974-6.
REFERÊNCIAS
1. Johnson LF. Optical maser characteristics of
rare-earth íons in crystals. J Appl Physiol. 1961;34:897-909.
2. Maiman TH. Stimulated optical radiation in
ruby. Nature. 1960;187:493-4.
3. Pinheiro ALB, Júnior AB, Zanin FAA. Aplicação
do laser na odontologia. São Paulo: Santos; 2010.
9. Guillet H, Miro L. Aplicações do laser na
medicina. O Laser. São Paulo: Manoele; 1987. p. 153-87.
15. Boari HGD, Ana PA, Eduardo CP, Powell, GL,
Zezell DM. Absorption and thermal study of dental enamel when irradiated with
Nd:YAG laser with the aim of caries prevention. Laser Physics.
2009;(19):1463-69.
17. Carruth JAS, Mckenzie AL,Hillekamp F,
Pratesi R, Sacchi CA. Lasers in biology and medicine. Nova York, Plenun Press;
1986.
18. Absten GT. Lasers in General Surgery. Nova
York: Champman-Hall; 1992.
19. Patel CKN, Mac Farlene RA, Faust WL.
Selective excitation transfer and optical maser action in N2-CO2.
Physio. Rev. 1964;(13):617-9.
20. Pinheiro ALB. The CO2 laser in
the oral cavity. M Dent Sci. 1990.
21. Pecora BC, Garehime WJ. The CO2
laser in oral surgery. J Oral Maxillofac Surg. 1983;(41):725-8.
29. Van As G. Erbium lasers in
dentistry. Dent Clin North Am. 2004;48:1017-59.
37. Fried D, Featherstone JDB, Visuri SR, Seka
W, Walsh JT. The caries inhibition potential of Er:YAG and Er:YSGG laser
radiation. In: Lasers in dentistry. Proceedings of the SPIE Meeting; 1996 Jan.
28-29; San Jose. Washington: Bellingham; 1996. p. 73-8.
42. Belikov AV, Moroz BT, Skripnik AV. Bacterial
activity in the products of laser destruction of human dental enamel and dentin.
Stomatologia. 1995;74(6):32-4.
45. Jorge ACT, Navarro RS, Freitas PM, Cassoni
A, Rodrigues JA. A influência do preparo cavitário e materiais restauradores na
prevenção da cárie secundária - estudo in situ. Rev assoc paul cir dent
2010;64(1):55-8.
* Ana Carolina Tedesco Jorge -
Mestranda em Odontologia com área de concentração em Dentística pela
Universidade Guarulhos, UnG.
** Alessandra Cassoni -
Mestre e Doutora em Odontologia – Área de concentração em Dentística pela
Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo, Professora Adjunta do
curso de Graduação e de Pós-Graduação da Universidade Guarulhos, UnG.
*** José Augusto Rodrigues -
Mestre e Doutor em Clínica Odontológica – Área de concentração em
Dentística pela Faculdade de Odontologia de Piracicaba – UNICAMP.
Professor Adjunto do curso de Graduação e de Pós-Graduação da Universidade
Guarulhos, UnG.