ESTUDO ANATÔMICO E
VARIAÇÃO NA CONCENTRAÇÃO DE IDIOBLASTOS COM RÁFIDES EM FOLHAS DE ARACEAE,
MANTIDAS SOB DIFERENTES CONDIÇÕES DE LUMINOSIDADE
ANATOMICAL STUDIES AND
THE VARIATION OF RAPHID IDIOBLASTS CONCENTRATION IN THE LEAVES OF ARACEAE KEPT
UNDER DIFFERENT LUMINOSITY CONDITIONS
RESUMO: A família Araceae compreende cerca de 106 gêneros e 3.000 espécies,
sendo amplamente distribuída nos neotrópicos, inclusive no Brasil. As
propriedades tóxicas das diversas espécies de Araceae
são responsáveis por muitos acidentes e se devem especialmente, à presença de
cristais de oxalato de cálcio do tipo ráfide, que se formam em idioblastos que
funcionam como células injetoras, devido à forma como estes cristais são
liberados. O presente trabalho objetivou verificar uma possível variação na
concentração de ráfides nos tecidos foliares de mudas cultivadas sob luz direta
e contínua, assim como mudas cultivadas sob sombra contínua, comparando-se as
mesmas com exemplares mantidos como controle em condições ambientais normais de
luminosidade. As espécies estudadas foram Dieffenbachia
picta Schott, Monstera
deliciosa Liebm e Philodendron
bipinnatifidum Schott. Para estudos anatômicos,
secções à mão livre e dissociações de epiderme foram obtidas no limbo e no
pecíolo das folhas, a confecção de lâminas semipermanentes seguiu a metodologia
usual para estudos em anatomia vegetal. Nos resultados, observou-se um sensível
aumento na concentração de idioblastos rafídicos nos
tecidos foliares dos exemplares mantidos sob luz contínua em relação aos
indivíduos controle e de sombra contínua, o que nos leva a concluir que a incidência
da luminosidade contínua levou ao aumento dos níveis de toxicidade das espécies
estudadas.
PALAVRAS-CHAVE: Araceae. Anatomia vegetal. Ráfides.
ABSTRACT: The Araceae
family includes about
106 types and 3.000 species, being widely distributed in the Neotropics, including Brazil. The toxic properties of
several species of Araceae are responsible for many
accidents that occur, especially, due to calcium
oxalate crystals in the form of raphids. These raphids develop inside idioblasts,
which act as injector cells due to the manner that these crystals are
liberated. The objective of this study was to verify a possible variation in
the raphids concentration of the leaf tissue from
cuttings cultivated under direct and continuous light and from cuttings
cultivated under continuous shadow. These plants were compared with control
plants, kept under normal luminosity conditions. The studied species were Dieffenbachia
picta Schott, Monstera
deliciosa Liebm and Philodendron
bipinnatifidum Schott. To anatomical studies,
free-hand sections and epidermis dissociation were made in both, leaf blade and
petiole. Semipermanent slides were prepared according
to standard protocols in plant anatomy. It was observed a sensitive increase in
the raphid idioblasts
concentration in leaf tissues of plants that were kept under continuous
light compared to control specimens and to plants grown in continuous shadow.
Because of that, we concluded that luminous incidence
of the former environmental condition led to an increase of toxicity levels in
the studied species.
KEYWORDS: Araceae.
Plant anatomy. Raphids.
INTRODUÇÃO
A família Araceae é subcosmopolita, com 106 gêneros e cerca de 3.000 espécies1. De acordo com IAS2 as Araceae compreendem, com a inclusão das Lemnaceae, cerca de 108 gêneros e 3.750 espécies de monocotiledôneas herbáceas e trepadeiras e, embora a família ocorra naturalmente em todos os continentes, exceto na Antártica, é predominantemente tropical. No Brasil, são encontradas aproximadamente 400 espécies distribuídas em 36 gêneros3 sendo a floresta atlântica considerada o centro secundário de diversidade3.
Com base nos recentes trabalhos de filogenia, a circunscrição de Araceae foi ampliada, com a inclusão dos gêneros tradicionalmente reconhecidos em Lemnaceae4. Considera-se que as Araceae tenham divergido precocemente a partir das monocotiledôneas5 ocupando uma gama de ambientes e ocorrendo em áreas, que variam de semidesertos a florestas pluviais ou regiões montanhosas6. Entretanto, segundo Gonçalves7, a maioria dos grupos é de ocorrência tropical ou neotropical e, apesar da importância numérica dos grupos associados à árvores (epífitas, hemiepífitas, trepadores), grupos geofíticos são consideravelmente diversos na família, aparentando ter surgido inúmeras vezes, em linhagens independentes. São comuns na Mata Atlântica as espécies de Monstera e Philodendron4.
Plantas
desta família são comumente causadoras de intoxicações em crianças e animais
pois, muitas delas são utilizadas como ornamentais. As espécies apresentam grande variabilidade, sendo a
maioria constituída de plantas terrestres, mas há várias epífitas e um gênero
aquático (Pistia). Enquanto existem aráceas
altamente tóxicas, tais como várias espécies de Dieffenbachia,
outras são comestíveis, como Colocasia esculenta (L.) Schott e Xanthosoma
violaceum Shott. Monstera deliciosa Adans,
além de ser bastante usada como ornamental, produz frutos comestíveis. Muitas Araceae são utilizadas como ornamentais, devido à beleza de
suas inflorescências e folhas, como por exemplo Anthurium
andraeanum Linden, Anthurium scherzerianum
Schott, Caladium bicolor (Aiton) Vent., Zantedeschia
aethiopica Spreng, Spathiphyllum walisii Regel,
Pistia stratiotes
L., Syngonium sp.,
ou medicinais (Acorus calamus,
Philodendron selloum)
ou, ainda, na produção de móveis, cestas e cordas (Heteropsis
rigidifolia Engl., Monstera deliciosa, Philodendron
selloum).
Segundo Balbach8, a toxicidade
nessas plantas é devida, principalmente, pela presença de cristais de oxalato
de cálcio na forma de agulhas, denominadas ráfides. Estas encontram-se em todas
as partes da planta e localizam-se em células especiais, chamadas de
idioblastos. Tais idioblastos são conhecidos como células injetoras devido à
forma como estes cristais são liberados. As ráfides são perfurantes e, quando
em contato com as mucosas, destroem as células causando edemas, dor e queimação
de lábios, língua, palato e faringe, sialorréia, disfagia, asfixia, cólicas abdominais, náuseas, vômitos e
diarréia. O mecanismo de reação alérgica não é apenas mecânico, possivelmente é
mediado pela presença de substâncias irritantes, que atuariam juntamente com os
cristais de oxalato de cálcio.
O presente artigo teve por objetivo estudar quatro espécies de Araceae (Philodendron bippinatifidum Schott, Monstera deliciosa Liebm, Zantedeschia aethiopica Spreng e Diffenbachia picta Schott), expostas a diferentes condições ambientais de luminosidade e de avaliar a possível influência na anatomia da folha, bem como produção de ráfides e a toxicidade do vegetal.
Um exemplar de cada espécie (Dieffenbachia picta, Monstera deliciosa e Philodendron bipinnatifidum)
foi mantido como controle, ou seja, cultivado em ambiente com
luminosidade natural (Figura 1).
Figura 1- Indivíduos estudados: A. Dieffenbachia picta;
B. Monstera deliciosa; C.
Philodendron bipinnatifidum.
Outro exemplar de cada foi mantido sob
luminosidade contínua; e ainda outro exemplar de cada mantido sob sombra
contínua, sendo que todos os exemplares foram cultivados durante o período de 6
(seis) meses, para que então fossem realizados os estudos anatômicos. Folhas
adultas, retiradas do 3º e 4º nós dos diferentes exemplares controles, foram
fixadas em FAA 70%9 e, após 48
horas, conservados em etanol 70%10,
para fins dos estudos citados.
Porções referentes às regiões costais e
intercostais do terço médio do limbo foliar, bem como porções da região mediana
do pecíolo, foram seccionadas à mão livre. A preparação do material para
montagem das lâminas semipermanentes seguiu a metodologia usual em anatomia
vegetal11.
Para dissociação das epidermes, os fragmentos do
terço médio das folhas de Dieffenbachia picta foram colocados em solução
de ácido nítrico à 50% e aquecido; já os fragmentos das folhas de Philodendron bipinnatifidum
e de Monstera deliciosa foram colocados
em solução de Jefrey. Após a dissociação, as
respectivas epidermes foram submetidas à técnica usual para coloração e
montagem de lâminas semipermanentes.
Para os testes histoquímicos foram
utilizados o Sudan IV9 para identificação
de substâncias graxas; o Lugol10 para detecção de grãos de amido; e
o floroglucinol acidificado12 para evidenciação de lignina.
Para contagem de idioblastos rafídicos, utilizou-se a microscopia óptica, onde foram
focalizados vinte campos diferentes sob objetiva 40x, de cinco lâminas
referentes aos diferentes exemplares em estudo e contadas as células
encontradas em cada campo.
Após análise em microscópio óptico (modelo Nikon Alphaphot 2YS2), as secções foram fotografadas em fotomicroscópio (Olympus modelo BX51).
RESULTADOS
Em vista frontal, a epiderme da lâmina foliar de Dieffenbachia picta mostra
as células epidérmicas propriamente ditas da face adaxial com paredes de
contorno levemente sinuoso nos indivíduos controle, acentuadamente sinuoso nos
indivíduos de luz e mais reto nos indivíduos de sombra (Figuras 2 e 3). Em Monstera deliciosa, paredes retas tanto nos
indivíduos controle, quanto nos de luz e de sombra (Figura 11); e em Philodendron bipinnatifidum,
ligeiramente retas tanto nos indivíduos controle, quanto nos indivíduos de luz
e de sombra (Figura 20). Na face abaxial, o grau de sinuosidade das paredes
apresenta-se semelhante nas três situações em D. picta (Figs. 4 e 5); o formato das
células é mais alongado e as paredes celulares são mais sinuosas, com relação à
face adaxial, em M. deliciosa (Figura
12); e levemente sinuosas em P. bipinnatifidum (Figura 21). Estômatos do tipo tetracítico ocorrem em ambas as faces da epiderme de D. picta ,
sendo mais numerosos na face abaxial (Figs. 4 e 5); numerosos estômatos paracíticos são detectados somente na face abaxial de M.
deliciosa (Figura 12); e estômatos do tipo tetracítico
ocorrem apenas na face abaxial de P. bipinnatifidum, o que caracteriza uma folha hipostomática (Figura 21). Tricomas
não são observados em nenhuma das espécies analisadas.
Em secção transversal observa-se que a epiderme é simples nas
três espécies estando recoberta, em ambas as faces, por cutícula fina e levemente
estriada em Dieffenbachia picta (Figura
6) e cutícula espessa em ambas as faces, tanto nos indivíduos controle, quanto
nos de luz e de sombra, em Monstera deliciosa
e Philodendron bipinnatifidum
(Figuras 13 e 22).
O mesofilo tem organização dorsiventral nas três espécies
analisadas. Em Dieffenbachia picta,
apresenta uma camada de parênquima paliçádico de células curtas e,
aproximadamente, nove camadas de parênquima lacunoso, no qual são detectadas
cavidades aeríferas (Figura 6); em Monstera deliciosa
apresenta uma camada de parênquima paliçádico e cerca de quinze camadas de
parênquima lacunoso, com espaços intercelulares de dimensões variáveis; em Philodendron bipinnatifidum,
exibe uma camada de parênquima paliçádico e cerca de seis camadas de parênquima
lacunoso, com espaços intercelulares bem desenvolvidos. Dispersos por todo o
mesofilo são observados idioblastos contendo drusas de oxalato de cálcio nas
três espécies (Figuras 6 e 24); em D. picta, as drusas se organizam numa faixa contínua entre
as células da paliçada (Figura 6). Também em D. picta, idioblastos com ráfides de
oxalato de cálcio são observados no parênquima lacunoso. Em M. deliciosa, é detectada a presença de tricoesclereídes em todo o mesofilo (Figura 13). Feixes
vasculares, correspondentes às nervuras terciárias e quaternárias, mostram
organização colateral e estão dispersos por toda a lâmina foliar, nas três
espécies.
A nervura mediana em secção transversal apresenta formato
biconvexo em Dieffenbachia picta (Figura
7), elíptico em Monstera deliciosa e plano-convexo em Philodendron bipinnatifidum.
Em M. deliciosa, o parênquima mantém
a disposição em paliçada na face adaxial, como observado na lâmina foliar (Figura
14). Em D. picta
e em P. bipinnatifidum,
o parênquima fundamental apresenta espaços intercelulares de dimensões
variáveis, por vezes constituindo cavidades aeríferas, o que caracteriza um
aerênquima (Figuras 7, 23 e 25). Dispersos entre as células do parênquima
fundamental são observados diversos idioblastos contendo drusas, ráfides e
cristais prismáticos de oxalato de cálcio, nas três espécies (Figuras 8, 15, 23
e 25). No parênquima fundamental são encontrados, ainda, diversos feixes
vasculares do tipo colateral (Figuras 7 e 14).
O pecíolo em secção transversal exibe contorno circular em Dieffenbachia picta e
contorno arredondado em Monstera deliciosa e em Philodendron bipinnatifidum. Em D. picta, o colênquima angular se
organiza em cordões isolados por parênquima fundamental (Figura 9); em P. bipinnatifidum,
o colênquima lacunar apresenta, aproximadamente, 15 estratos celulares (Figura
27). O parênquima fundamental nas três espécies apresenta-se constituído por
células com formato isodiamétrico, que delimitam espaços intercelulares de dimensões
variáveis os quais, na região mais mediana do pecíolo, caracterizam um
aerênquima (Figura 26). Idioblastos com drusas, ráfides e cristais prismáticos
de oxalato de cálcio são detectados por todo o parênquima fundamental,
inclusive no interior e na periferia das cavidades aeríferas, nas três espécies
(Figuras 10, 18, 19, 28-30). Em M.
deliciosa observam-se esclereídes na região mais
periférica do pecíolo, em maior número nos indivíduos de luz (Figura 16). Em P. bipinnatifidum,
dispersos pelo colênquima e pelo parênquima fundamental, observam-se outros
idioblastos, os quais armazenam antocianina, substâncias fenólicas, além de
ductos secretores, cujo conteúdo reage aos testes de identificação para
substâncias lipídicas (Figura 31). Feixes vasculares, de organização colateral,
encontram-se dispersos por todo o parênquima fundamental nas três espécies (Figuras
17 e 26).
Figuras 2 a 10. Dieffenbachia
picta. Figuras 2 a 5. Vista Frontal da epiderme
da lâmina foliar. Fig. 2 e 3. Face adaxial. Fig. 2. Indivíduo controle (Barra=
50 μm); Fig. 3. Indivíduo de luz (Barra= 100μm). Figuras 4 e 5. Face
abaxial. Fig. 4. Indivíduo de luz (Barra= 25 μm); Fig. 5. Indivíduo de
sombra (Barra= 100 μm). Figura 6. Secção transversal da lâmina foliar.
Indivíduo de sombra. Ca= cavidade aerífera. (Barra= 100μm). Figuras 7 e 8.
Secção transversal da nervura mediana. Figura 7. Aspecto geral da secção da
nervura de indivíduo controle. Fv= feixe vascular
(Barra= 250μm). Figura 8. Detalhe dos idioblastos com ráfides em indivíduo
de luz (Barra= 25 μm). Figuras 9 e 10. Secção transversal do pecíolo de
indivíduo de luz. Figura 9. Pormenor da face adaxial do pecíolo (Barra=
100μm). Figura 10. Detalhe de um idioblasto com drusa (Barra= 25 μm).
Figuras
11 a 19 – Monstera deliciosa.
Figuras 11 e 12. Vista frontal da epiderme da lâmina foliar. Fig 11. Face adaxial de indivíduo de sombra (Barra=
50μm). Figura 12. Face abaxial de indivíduo de luz (Barra= 50μm).
Figura 13. Secção transversal da lâmina foliar de indivíduo de luz. Detalhe da
face adaxial evidenciando tricoesclereíde no mesofilo
(Seta) (Barra= 25 μm). Figuras 14 e 15. Secção transversal da nervura
mediana de indivíduo controle. Figura 14. Detalhe da face adaxial, evidenciando
a disposição em paliçada do parênquima (Barra= 100 μm); Figura 15. Detalhe
de um idioblasto com drusa (Barra= 25 μm).Figuras 16 a 19. Secção
transversal do pecíolo. Figura 16. Aspecto geral da região mediana de indivíduo
de luz, evidenciando esclereídes (Seta) (Barra= 50
μm); Figura 17. Detalhe de um feixe vascular de indivíduo de luz,
destacando as fibras pericíclicas mais desenvolvidas
na porção floemática (Fp) (Barra= 50 μm); Figura
18. Pormenor de um idioblasto com cristal prismático de indivíduo controle
(Barra= 25 μm); Figura 19. Pormenor das ráfides de indivíduo controle
(Barra= 25 μm).
Figuras 20 a
31. Philodendron bipinnatifidum.
Figuras 20 e 21. Vista frontal da epiderme da lâmina foliar. Figura 20. Face
adaxial de indivíduo de sombra (Barra= 50μm). Figura 21. Face abaxial de
indivíduo de luz (Barra= 50μm). Figura 22. Secção transversal da lâmina
foliar. Pormenor da face adaxial de indivíduo de luz (Barra= 25μm).
Figuras 23 a 25. Secção transversal da nervura mediana. Figura 23. Pormenor de
cavidades aeríferas de indivíduo de luz, evidenciando os idioblastos com ráfides
(Barra= 50 μm). Figura 24. Detalhe dos idioblastos com drusas (Seta) nas
cavidades aeríferas de indivíduo de sombra (Barra= 50μm). Figura 25.
Idioblasto com drusa (Seta) no mesofilo de indivíduo de sombra (Barra=
50μm). Figuras 26 a 31. Secção transversal do pecíolo. Figura 26. Aspecto
geral da região mediana de indivíduo controle (Barra= 250μm). Figura 27.
Aspecto geral da região periférica de indivíduo de sombra (Barra= 100μm). Figura
28. Pormenor de uma cavidade aerífera de indivíduo de sombra (Barra= 100μm).
Figura 29. Detalhe de um idioblasto com ráfides, evidenciando o momento da
liberação das mesmas em indivíduo de luz (Barra= 25μm).
Figura 30. Detalhe de um idioblasto com drusa na cavidade aerífera de indivíduo
de luz (Barra= 25μm). Figura 31. Pormenor de um ducto secretor em
indivíduo de luz (Barra= 25μm).
DISCUSSÃO
De acordo com Solereder
e Meyer13, o aparecimento de tricomas nas folhas de Araceae é incomum. Porém, Esau14 afirma que
estas estruturas são encontradas em abundância em monocotiledôneas. Concordando
com a afirmação do primeiro autor, foi observada a ausência de tricomas em
todos os indivíduos estudados nas diferentes condições ambientais.
Observa-se nos indivíduos de Dieffenbachia
picta, tanto no exemplar controle, como nos de
luz e de sombra, que a epiderme é simples, recoberta por cutícula fina e
levemente estriada. Já nos indivíduos de Monstera
deliciosa e Philodendron bippinatifidum, a epiderme foliar apresenta-se simples
e recoberta por cutícula espessa, em ambas as faces. Os resultados observados
concordam com a afirmação de Solereder e Meyer13,
na qual relatam que a cutícula em Araceae varia
consideravelmente tanto em espessura, como também em sua morfologia.
De acordo com Esau14, as células
epidérmicas apresentam várias características relacionadas à sua posição
superficial. Em sua maior parte variam em formato, mas são frequentemente tabulares. Foi observado em Monstera deliciosa, nos indivíduos controle,
de luz e de sombra, que a epiderme foliar em vista frontal mostra estas
células, tanto na face adaxial, como na face abaxial com
contorno levemente sinuoso, formato quadrangular e de dimensões maiores na face
adaxial. Em Philodendron bippinatifidum a epiderme da lâmina foliar apresenta
células ligeiramente retas na face adaxial e levemente sinuosas na face
abaxial.
Segundo Mayo et al3, nas folhas da maioria das aráceas, os estômatos são
escassos, predominando na face abaxial. Concordando com a afirmação desses
autores foi observado que, em Monstera
deliciosa e em Philodendron bippinatifidum, os estômatos ocorrem apenas na face
abaxial, sempre ao mesmo nível das demais células epidérmicas. Já em Dieffenbachia picta,
os estômatos ocorrem em ambas as faces da epiderme, o que está de desacordo com
o afirmado pelos autores.
Ainda de acordo com Mayo
et al3, as camadas de parênquima paliçádico apresentam células
curtas e relativamente largas, que estão separadas por cavidades aeríferas. Foi
observado em Dieffenbachia picta, a presença de células curtas de parênquima
paliçádico e cavidades aeríferas foram detectadas no parênquima lacunoso, sendo
tais cavidades mais desenvolvidas em indivíduos de sombra. Nos exemplares de Philodendron bippinatifidum
e Monstera deliciosa também observam-se
cavidades aeríferas, sendo que, em P. bippinatifidum,
os espaços intercelulares são bem desenvolvidos e em M. deliciosa, estes
espaços possuem dimensões variáveis.
Engler15, trabalhando com cortes
transversais do pecíolo, demonstrou que os feixes de fibras podem ser
encontrados próximos ou não do floema. Em Dieffenbachia
picta, estes feixes são encontrados dispersos por
todo o parênquima fundamental, enquanto que em Monstera
deliciosa, estão distribuídos por todo o pecíolo e, alguns, junto ao
floema. Em Philodendron bippinatifidum,
os feixes vasculares estão distribuídos pelo parênquima fundamental. Tais
observações concordam com o que foi afirmado pelo referido autor.
Dispersos no mesofilo, nas nervuras e no pecíolo
de Philodendon bippinatifidum
e Diefenbachia picta,
tanto nos indivíduos controle, como nos de luz e de sombra, foi detectada
grande quantidade de idioblastos com ráfides e com drusas de oxalato de cálcio.
Estes cristais estão distribuídos pelo aerênquima e parênquima das regiões
citadas, o que concorda com Prychid e Rudall16,
que afirmam ter sido encontrada a presença de idioblastos rafídicos
e de drusas em todas as partes da planta, distribuídos nos tecidos
parenquimáticos e em estruturas especializadas, como as cavidades aeríferas. A
presença destes cristais, segundo as autoras, simboliza uma apomorfia
significante para a família. No entanto, em desacordo com as mesmas, esta
característica não foi observada nos indivíduos de Monstera
deliciosa, tanto de luz como também de sombra. Foram detectadas apenas
algumas agulhas dispersas na região do pecíolo, porém em pequena quantidade. De
acordo com Esau17 e Madson12, estes cristais são
considerados como produtos residuais ou como agentes de proteção da planta
contra herbivoria.
Em Philodendron
bippinatifidum, observou-se no parênquima
fundamental do pecíolo, idioblastos, que armazenam o pigmento antocianina e
substâncias fenólicas, além de drusas de oxalato de cálcio. Ainda nesta espécie
é observada a presença de ductos secretores, cujo conteúdo reage aos testes de
identificação de substâncias lipídicas, embora Mayo et al.3 refiram que o conteúdo de tais ductos seja de resina.
De acordo com Prychid e Rudall16 a quantidade de cristais de oxalato de cálcio do tipo ráfide
variam de 4 a 6 por célula Em Philodendron bippinatifidum, entretanto, foram detectadas nas
cavidades aeríferas, quantidades maiores destas estruturas.
Segundo Stella et
al.18, com o
aumento da intensidade luminosa, a taxa fotossintética também aumenta
lentamente ou se estabiliza. Desta forma, a luz atua diretamente sobre as
variações morfológicas nos vegetais e uma possível variação morfológica estaria
relacionada com o aumento na concentração de idioblastos com ráfides.
De acordo com o esperado, observou-se em Philodendron bippinatifidum
e Diefenbachia picta
que os indivíduos de luz contínua apresentam maior concentração de idioblastos rafídicos em relação aos indivíduos controle e de sombra.
Em Philodendron bippinatifidum
houve uma diminuição significativa no número de idioblastos com ráfides nos
indivíduos de sombra, em relação aos indivíduoas
controle e de luz, o que novamente concorda com Stella et
al.18.
Este estudo possui
grande valor no que tange à questão da segurança e da saúde da população, pois,
como foi demonstrado, ocorre um aumento significativo na concentração de
idioblastos rafídicos em indivíduos de luz, resultado
este que pode ser utilizado na prevenção de acidentes domésticos com crianças e
animais desenvolvendo, para isso, um trabalho de alerta e conscientização dos
perigos que estes vegetais apresentam.
AGRADECIMENTOS: Ao
PIBIC/UnG e ao CNPq pela Bolsa de Iniciação Científica concedida, fundamental
para a execução deste trabalho.
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* Sandra Raquel
Medeiros, Bióloga ex-Aluna PIBIC/UnG. e-mail:sandrarmsaito@gmail.com.
** Vera Fatima Gomes Alves Pereira Lima, Professora Adjunta da Universidade Guarulhos. e-mail:vfgalves@yahoo.com.br